segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

"Migrantes": Por um teatro construtivo.


Joinville nesses últimos anos vem ampliando o espaço para as artes, e com isso o teatro está se sobressaindo como opção de entretenimento, e mais do que isso, uma forma de conhecer e analisar questões pertinentes à cultura construída até hoje na cidade.

Estou falando do último espetáculo realizado pela Companhia Dionísos de Teatro, que no seu décimo ano apresentou a peça “Migrantes”, que veio somar em seu repertório, como a 12ª montagem.

Tenho aqui muitas razões para postar e analisar essa produção, mas o motivo principal é a questão da perspectiva da peça em si, o trabalho do diretor e autor Silvestre Ferreira e sua companhia vai além de produzir arte pela arte, é fazer com que o espetáculo tenha mais vida, ocasionando numa função social, principalmente para a população de Joinville.

A principal fundamentação da peça foi entrevistas de migrantes, que em Joinville vieram a partir da década de 1970, no boom migratório, um fenômeno que transformou a cidade na maior e mais habitada de Santa Catarina. É importante citar aqui O Laboratório de História Oral da Univille, e a coordenadora Raquel S. Thiago como um eixo entre o projeto da peça e as fontes que serviram de base para a temática da produção.

A questão é: quando se tem entrevistas como base para produção, especificamente essa, remete às memórias, e assim histórias de vida que sucederam no período que agitou a cidade de Joinville no âmbito sócio cultural, bem como econômico.

Nesse sentido, temos uma adaptação teatral para questões relacionadas à história de Joinville, e histórias que contribuíram para a configuração cultural da cidade hoje. Se analisarmos do ponto de vista social, temos questões relevantes causadas pelo fator migração, que são as discriminações e preconceito cultural, ou melhor, a resistência de joinvilenses naturais aos indivíduos que aqui não nasceram, ou que tem descendência em outro estado e/ou cidade.

A apresentação mostrou o microcosmo da história não contada de Joinville, memórias de pessoas que saíram de situações miseráveis, e que aqui encontraram uma oportunidade de trabalho e com isso construíram uma vida mais digna, obtiveram suas próprias casas, e condições de criar seus filhos sem passar fome, ou em outras situações, como acontece na peça, histórias de amor e de conquista.

Mas o ponto principal foi à interação entre os atores e a platéia, que no meu ponto de vista, é o auge do teatro, e só aconteceu devido às relativas identificações dos espectadores perante às interpretações dos atores. É dessa forma que o teatro vai funcionar realmente como deve, é só dessa forma que a arte funcionará como estímulo à reflexão e ao respeito às diversidades culturais, fazendo com que indivíduos compreendam outras situações de vida, ou nesse caso, que não continuem reproduzindo a discriminação e exclusão que, principalmente, os bairros mais afastados de Joinville vêm sofrendo com o poder público e as mídias locais.

Esse espetáculo também ganhará mais força quando apresentar-se nas comunidades construídas a partir das migrações desde 1970. Quero novamente chamar a atenção para a alienação que a sociedade se submete, se até 1970 tínhamos pouco menos de 200 mil habitantes, em quase 40 anos esse número aumentou para 600 mil, quer dizer que não somos uma cidade germânica, e que Joinville não é, e nunca foi cidade dos Príncipes. Somos uma cidade com uma diversidade cultural equivalente às grandes metrópoles do Brasil, não em número, mas em proporções, e que façamos desta uma cidade mais humana e menos fria em relação aos bairros ocupados pelas multidões que não tiveram outra escolha a não ser vir atrás de uma nova vida, uma nova terra.



Para quem não assistiu ao espetáculo, fica a dica para a próxima temporada.



Link para A companhia: http://www.dionisosteatro.com.br/
Foto:http://cidadecultural.blogspot.com/2007/12/migrantes-da-dionisos-teatro-toca-pela.html

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